21 março, 2007

DIAS SALAZARENTOS

O MUSEU DE SALAZAR

No passado dia 3 de Março, ao fim da tarde, depois de ter assistido a algumas cerimónias comemorativas deste dia importante para Penafiel, tive uma surpresa. Ao passar por uma das paragens-abrigadas de autocarro, na avenida Pedro Guedes, e num dos espaços destinados à publicidade, fui confrontado com uma imagem de encher o olho. Imagem essa que apelava ao voto numa determinada personalidade. E quem era essa personalidade? Nem mais nem menos, que Salazar. Ele mesmo, o António Oliveira Salazar. O cartaz em questão, solicitava o voto dos cidadãos para que ele fosse eleito o maior português de todos os tempos.

Bem, eu pensei que existiriam outras imagens de outros candidatos espalhados pela cidade, porque como se sabe, são 10 os finalistas neste concurso inventado pela RTP. Procurei pela cidade, mas nada. Nada de Camões, nada de Pessoa, nada de Marquês. E nada dos outros. Encontrei uns dias mais tarde um cartaz dedicado a D. João II, perto do cemitério municipal de Penafiel. Creio que ainda apareceu mais um Salazar em Novelas.

Com que então, D. João II e Salazar! Com que então Salazar e D. João II! Escapou-me logo boca fora: “olha que dois!” Um primeiro ministro e um rei de Portugal. Um ditador e uma ave de rapina. Um que inventou a Pide para vigiar o país das más línguas e o outro que contratou o pirata Vasco da Gama, para invadir a Índia e “sacar” as almejadas especiarias. Um que atrasou Portugal várias décadas e o outro que foi o grande percursor da escravatura e do colonialismo, do Portugal tordesilhado de além-mar.

Como tenho uma visão nada positiva dos “descobrimentos”, logo não vou falar dessa histórica pantomineirice. Só o farei quando houver razões para tal, isto é, quando for conhecida a classificação final desses três grandes escorbutos da nossa história, que foram, D. João II, Infante D. Henrique e Vasco da Gama, no tal concurso da RTP “o maior português de todos os tempos”.

De facto o que aqui me traz, é mesmo Salazar e a pretensão de se criar em Santa Comba Dão, um museu com o nome do homem que içou bem alto a bandeira do “Portugal dos pequeninos”.

E o que é que se me oferece dizer sobre tal projecto? Oferece-me dizer que estou plenamente de acordo. Subscrevo por baixo a intenção de levar por diante a construção desse museu. Estou de acordo, porque defendo que se avive sempre a memória nos pedaços da nossa história.

Esse museu que se chamará eventualmente Museu Salazar, deverá conter no seu interior, “retratos” relacionados com salazarismo e o Estado Novo. Por exemplo, deverá conter todas as fotografias dos soldados mortos na guerra Colonial. Todas. Que são cerca de dez mil. Todas as fotos dos 50 mil estropiados dessa mesma guerra. Mais ao lado, bem visível, estaria uma bela imagem pintada a sangue, de Humberto Delgado, “emoldurada” pelas milhares de fotos dos bufos, carrascos e assassinos da Pide.

Bem defronte a uma parede recheada de inúmeros recortes de jornais, com fotos desse campo de terror que foi o Tarrafal, um andor criado para o efeito, daria relevo a uma imponente escultura em cera, reproduzindo o mais célebre casamento da história de Portugal: o catolicismo com o fascismo, corporizado por Oliveira Salazar e sua “eminência”, o cardeal Cerejeira.

Por outro lado, e subscrevendo aqui algumas “bocas” do “Compadre Vicêncio”, num dos programas da “Praça da Alegria”, o museu Salazar, não devia ter luz eléctrica, nem quartos de banho, nem qualquer tipo de saneamento, que era o que não tinha a maioria dos portugueses no tempo em que Salazar atrasou este país. Muito menos, livros, jornais, apontamentos, sequer grandes leituras, porque o país salazarento não sabia ler, nem escrever, era analfabeto.

Um dos ex-líbris daquele monumento de homenagem ao regime fascista, seria a instalação de um porteiro, que estaria ali, não para rasgar os bilhetes de entrada, mas para ser no exterior uma montra do que havia no seu interior. Esse porteiro, devia ser o espelho da nação daquele tempo, isto é, pobre, pedinte, ignorante e de terço nas mãos.

Eu não entendo que haja quem sustente, que o museu Salazar no Vimieiro, seria uma mais valia para o concelho de Santa Coma Dão, prevendo grande afluência de visitantes e turistas. Eu não sei se será assim, porque não estou a ver, quem terá pachorra para andar por lá a vender santinhos a tostão e canecas de vinho a c´roa.

Haverá ainda neste país, assim tantos saudosistas dos três “efes” e do “passa fome e anda alegre”? Às tantas há. Às tantas, o que resta do país rural e atrasado, vai excursionisticamente por aí acima em romaria homenagear o ditador santacombadense.

Nunca se sabe se ali não estará a chave da resolução de problemas relacionados com o empobrecimento e desertificação do interior.

Nunca se sabe. Por isso para a frente com o museu António Oliveira Salazar.

eXTReMe Tracker